Faz aproximadamente um ano que um amigo me apresentou um livro em inglês que naqueleexato momento se tornava um fenômeno de vendas no mercado norte-americano. O livro era“A Cabana”, escrito por William Paul Young, um autentico marinheiro de primeira viagem nodisputadíssimo mercado editorial dos Estados Unidos. Surpreendentemente, poucos mesesdepois, me deparei com o livro em português e o mesmo sucesso alcançado nas terras do TioSam veio a ser reeditado em nosso mercado tupiniquim.Para aqueles que não leram o livro, trata-se de uma ficção na qual o personagem principal, umpai de família chamado Mackenzie Allen Phillips, vive um profundo drama ao ter sua filhacaçula raptada e morta brutalmente numa cabana próxima de um camping onde passavaalguns dias com seus três filhos mais novos. Após um período de aproximadamente 3 anos deprofunda tristeza, Mackenzie recebe um estranho bilhete assinado por “papai” (Deus)convidando-o para passar com Ele um fim de semana naquela mesma cabana.Para a decepção de alguns, não pretendo aqui entrar nas inúmeras discussões teológicas queenvolve este livro. Gostaria apenas pontuar um aspecto que me chamou atenção na leitura efazer dele o ponto de partida para a nossa reflexão. Trata-se do interessante encontroretratado no livro entre um representante da religiosidade estéril desenvolvida na cultura dostemplos e a pessoa de um Deus altamente afetivo e relacional, nos convidando para um fim desemana numa cabana.A Religiosidade e a Cultura dos TemplosVia de regra, gente profundamente religiosa é formada na cultura dos “templos”, onde sãomotivadas a conceber Deus como um ser todo poderoso e soberano, mas distante de suasvidas, seus sentimentos e, principalmente, suas dores. Nesta concepção, Deus não existepara ser apreciado num relacionamento de intimidade, mas temido por sua austeridade nosjulgamentos e severidade nas punições das falhas e incoerências de homens e mulheres.Esta concepção leva ao caminho justamente oposto da verdadeira espiritualidade. Temendo aausteridade do julgamento de Deus e a severidade de sua punição, religiosos passam a seesforçar por viverem um padrão moral acima da media da sociedade, freqüentaremdominicalmente as reuniões de suas igrejas e ocuparem suas vidas com o maior numero deatividades e cargos institucionais. Assim, ao invés de construírem uma relação com Deusbaseada exclusivamente em Sua graça, passam a viver o equívoco da auto-salvação.Além disso, na cultura dos “templos” a relação com Deus se caracteriza pela formalidade.Acredita-se que Deus seja mesquinho ao ponto de não se relacionar conosco se nãoseguirmos a etiqueta ou ritual certo, no qual existe a correta ordem entre musicas, orações eleituras. Neste ritual, existe também o espaço para um discurso religioso sobre Deus, no qualEle é descrito como se fosse um ser imóvel e estático sobre uma fria mesa de alumínio.Conseqüentemente, na religiosidade produzida pela cultura dos templos, não existe prazer emestar com Deus, nem muito menos entusiasmo para contar a amigos e parentes acerca dequão bom é relacionar-se com Ele. Não existe vitalidade que gera transformação espontâneagerada não pela imposição de uma regra, mas pelo constrangimento diante de um amorincondicional que insiste em nos abraçar mesmo quando não nos consideramos merecedorese persiste em nos dar uma nova chance quando ninguém ao nosso redor o faria.A Espiritualidade e a Cultura das CabanasA parte das inúmeras questões teológicas que envolve o livro “A Cabana”, o fato é que a formacomo Deus é ali apresentado surpreende a todos, mas especialmente aqueles que seencontram envolvidos por esta cultura religiosa desenvolvida e nutrida nos templos. Por que?Porque o Deus da cabana não se apresenta como um ser imóvel e estático a espera de nossoritual, mas sim como um Deus que se move na direção de homens e mulheres que sofrem, osconvida para uma relação de intimidade e compartilha com eles sua alegria e seu cuidado.Sendo assim, mesmo não concordando com tudo o que é escrito ou descrito no livro citado,creio que ele aponta para o fracasso da cultura religiosa dos templos e para a necessidade dedescobrirmos novas bases para a construção de uma relação efetiva e afetiva com Deus.Creio que estas bases são lançadas na própria revelação de Deus que se afirma como sendo“amor” e estabelece que a única forma de nos relacionarmos com Ele é através de nossaconfiança plena no Seu amor maior demonstrado na vida, morte e ressurreição de Jesus.Assim, chamo de “cultura das cabanas” este espaço que, livres da cultura religiosa arrogantedos templos, temos a oportunidade para uma relação com Deus não baseada nacompreensão de seus mistérios, mas na simples reverência pela sua grandeza indescritívelpara seres limitados e frágeis como nós. Desta forma, somos convidados a umaespiritualidade caracterizada pela humildade em reconhecer que Deus é efetivamente Deus enós somos seus filhos incapazes de compreender a totalidade de quem Ele é e a razão detudo o que ele faz.Ainda, nesta “cultura das cabanas” redescobrimos também que apesar de Deus serimensamente maior e superior do que tudo quanto imaginávamos, Ele tem um profundointeresse pelas nossas vidas e nos convida a vivermos com Ele uma intimidade prazeirosa etransformadora. Somos para Deus como suas crianças que, em Jesus, são convidadas avoltarem para casa e se deixarem envolver pelos seus braços em plena confiança de que Elecuidará de nós e dará um jeito na bagunça que fizemos de nossas vidas e mundo.Um convite finalO livro “A Cabana” provocou as opiniões mais variadas. Uns amaram de paixão erecomendarão a leitura a todos como se fosse uma “nova revelação”. Outros, decretaram quese tratava de uma das maiores heresias dos últimos anos e, por isso, não merecia nem sermencionado por cristãos. Sem apegar-me ao conteúdo em si do livro, apenas diria que nossasvidas seriam renovadas e nossas igrejas revitalizadas se aceitássemos o convite depassarmos mais tempo a sós com Deus, quem sabe, num fim de semana, numa cabana.
Pr. Ricardo Agreste.
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